Entrevista: Desafios do fotojornalismo

por Cley Medeiros

ENTREVISTA
O fotógrafo atual encontra diversos riscos em áreas de conflitos, claro. Mas a motivação de alguns pode ultrapassar o medo de estar numa “zona de guerra”.

Yiannis Biliris, 31anos, nasceu em Atenas, na Grécia. Com 10 anos de experiência tem em seu currículo vários prêmios. Em 2009 obteve menção honrosa  no International Photography Awards.  Sete de suas fotografias foram para a final no People's Choice em 2010. E no mesmo ano, 2010, obteve menção honrosa no Int'l Photography Arwads, no categoria “política”. Nesse ano, o fotógrafo, venceu o Prix de la Photographie, na França.

Desde jovem, com o sonho de explorar o mundo através de uma lente, Biliris já passou por diversos países e situações que só mesmo um espírito aventureiro passaria, deixando a timidez  de lado para dar lugar a sua paixão. Biliris conta ao ABJ Notícias mais sobre o mundo da “fotografia de conflitos”.

Seu trabalho era focado em fotografias comuns. Mais recentemente, você se dedicou a fotografar áreas de conflitos, principalmente na Grécia. O que levou a essa mudança?

É verdade que o meu trabalho até agora não tinha nada a ver com áreas de conflito ou violência. Minha lente mudou sua orientação desde o dia em que o ambiente em que habito começou a mudar também. O meu país está passando por uma dura crise econômica, as pessoas estão perdendo seus empregos, a violência policial se torna mais cruel à medida que o tempo passa. Eu não podia continuar "fazendo arte" e ignorar a realidade que está lá fora. A diferença mais importante entre o meu trabalho anterior e o que faço agora é que desta vez você está lidando com o futuro e as vidas dos seres humanos. Tudo pesa mais.



Fotógrafos em zonas de conflito geralmente vivem com o perigo de sequestro, morte ou outros tipos de violência. Em sua experiência como fotógrafo nessa área, você já se deparou com uma situação que pode oferecer risco à sua vida?

Fotografar os tumultos no centro de Atenas, por exemplo, está se tornando mais e mais perigoso. Chegamos a um ponto em que você reza para voltar para casa vivo. Vejo muitas pessoas feridas, mortas e, infelizmente, estou começando a me familiarizar com o tipo de cena. Isso é um tanto preocupante, acredito. Certa vez, aconteceu de eu estar no lugar errado na hora errada. A primeira coisa que passou pela minha cabeça foi que estava bem perto de morrer. Pensei que estava tendo a mesma sensação de quem morre por asfixia ou pisoteio. Foi muito sufocante. De modo geral, até agora eu tive sorte. Eu tento tomar as precauções apropriadas. Um capacete e máscara são essenciais.

Hoje o acesso das pessoas às câmeras fotográficas é facilitado. No caso da morte de Muammar Kadafi, por exemplo,  as primeiras imagens divulgadas foram feitas por um amador em sua câmera de celular. Isso é bom ou ruim para o fotojornalista profissional?

Se formos falar em termos de trabalho, certamente não é positivo. Mas, se quisermos ver isso do ponto de vista da informação ou mesmo o da  fotografia em si, eu acredito que é o próximo passo, é o futuro. Se essa pessoa que possuía um celular com  câmera não estivesse lá, não teríamos essas imagens. Para melhor ou pior, hoje o nosso equipamento de campo caro não deve ser encarado como um obstáculo: o acesso a câmeras está se tornando  mais democrático, e isso é ótimo. Hoje em dia, todo mundo tem os meios de produção de fotografias, vídeos. Até mesmo prduzir um documentário é bem mais fácil. O lado ruim disso é o "ruído" que está sendo criado, a qualidade dessas produções é baixa, o que torna ainda mais difícil encontrar novos tesouros fotógraficos.

Em muitos conflitos, há claros interesses na produção e distribuição de imagens e textos, principalmente por agências de notícias. Por você ser independente, você pode manter certa imparcialidade na hora de captar os fatos?

O trabalho que eu faço, a principio, não está à venda. Apenas tenho colocado nas imagens que capturo uma licença Creative Commons, que é aberta para visualização, desde que cite a fonte. Talvez seja porque eu não sou um fotojornalista profissional, no sentido original da palavra, ou talvez seja porque não há uma ligação direta emocional com a fotografia. Isso me ajuda a evitar qualquer tipo de pressão para perseguir histórias particulares e, ao mesmo tempo, me permite mostrar a história que eu quero. Eu acredito na “contrainformação”, uma vez que todos nós somos confrontados com a realidade invertida da mídia.

No meio do conflito, há situações que podem colocar a vida das pessoas em risco. São também situações que dariam boas fotos para mostrar um momento de terror ou dificuldade. Qual é o papel do fotógrafo nesse caso? Ele só deve ser focado em encontrar a imagem perfeita ou pode de alguma forma interferir no evento e até mesmo ajudar uma vítima?

O principal papel de um fotógrafo é "contar" as pessoas o que está acontecendo lá fora. Creio que é a principal necessidade hoje, mais do que nunca. Você tem que registrar a resistência das pessoas, mas, ainda mais importante, você tem que registrar a supressão delas pelo Estado. Se em algum momento eu tenho que colocar a minha câmera de lado e ajudar alguém, não me sentirei incomodado com essa escolha. Antes de ser fotógrafo, eu sou um ser humano.

As novas tecnologias trazem maravilhas em  tratamento de imagem. Pequenos aparelhos, como o iPod, podem usar programas-filtros que tornam o quadro ainda mais realista. Na sua opinião, como a tecnologia interfere na busca de imagens, especialmente aquelas em áreas de conflito?

Eu diria que sou tradicional. As coisas mais importantes são o momento e a luz, todo o mais vem em segundo lugar. Eu não uso uma aberração de equipamento. Quando se trata da pós-produção que poderá corrigir a imagem, eu não vou usá-lo [o programa de edição de imagem], a fim de criar a imagem lá. Acredito que esses retoques não podem interferir no tom da foto original.

Mesmo em face de riscos constantes, você pretende continuar a trabalhar em regiões de conflito? Quais são seus novos projetos?

O novo projeto que estou preparando agora não terá nada a ver com regiões de conflito, acredito.   O Photographs From The Riots (Fotografias de tumultos, projeto do fotógrafo) continua a correr. A verdade é que esse trabalho específico me mudou também. Além disso, não posso imaginar nada acontecendo nas ruas e eu estar ausente. Eu acho que, se no futuro eu me encontro de novo no meio de uma história que me interessa, eu vou segui-la, independentemente de ela ocorrer numa zona de conflito ou não.

O trabalho realizado por Yiannis Biliris pode ser acessado em http://yiannisbiliris.com/



Tags: ,

Sobre a ABJ

A ABJ é a agência júnior de jornalismo do curso de Comunicação Social do Unasp - Centro Universitário Adventista de São Paulo.

0 comentários

Comente Esta Notícia