Entrevista: 7 bilhões de pessoas no mundo, o problema não está na quantidade

Doutora Germana Ponce de Leon. Foto: Léo Neves
ENTREVISTA
O mundo comemorou no dia 30 de outubro, deste ano, o nascimento do habitante de número 7 bilhão da Terra. A menina Danica May Camacho, que nasceu nas Filipinas, ilustra o crescimento demográfico mundial. Entretanto, por mais celebrado que tenha sido o simbólico título, esse crescimento demográfico traz algumas preocupações e dúvidas sobre a qualidade de vida e quantidade de recursos no futuro.

O ABJnotícias entrevistou a socióloga Germana Ponce de Leon, doutora em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Ela atua principalmente no campo do conhecimento da geografia humana e na geografia da saúde. No momento, leciona no Centro Universitário Adventista de São Paulo, campus Engenheiro Coelho, São Paulo. Confira abaixo a entrevista na íntegra.

ABJnotícias - Quais os motivos desse crescimento populacional?
Germana Ponce de Leon - Sabe-se que esse número é uma estimativa. Há muitas pessoas que nem existem existindo, ou melhor: pessoas que não são registradas e por isso não existem legalmente. Então talvez esse número seja apenas uma forma de tirar nossa atenção de coisas que realmente são mais importantes. Esse alarme também aconteceu no século XIX e muitos se preocuparam em controlar a natalidade dos países periféricos, principalmente (por que será?). Não vejo nada assustador em a população crescer. A população também morre. As pessoas estão demorando mais a morrer em alguns lugares pelo acesso a tecnologia e alimentação com um mínimo de nutrientes, mas em outros lugares a mortalidade continua altíssima. Muitas crianças nascem sem existir, legalmente falando. Sendo mais pontual: o crescimento populacional atual acontece por mudanças positivas na saúde pública, no acesso à tecnologia tanto no que se refere ao acesso a medicamentos, fruto dessa tecnologia, quanto ao acesso a recursos alimentícios variados (frutas do mundo inteiro) em função também dessa tecnologia.

ABJnotícias - O número de pessoas no planeta vai continuar aumentando? Quais as expectativas?
Germana - Entendo que o número de pessoas vai continuar aumentando, mas a mortalidade também. Pois a falta de acesso a uma assistência médica adequada é presente; existem pessoas sem acesso a água potável; muitas que são vítimas de acidentes, assaltos, overdose, continuarão existindo e tem aumentado significativamente na atualidade. Isso sem falar nos desastres naturais que tem destruído muitas vidas humanas. Dessa forma, não é possível criar tantas expectativas.

ABJnotícias - O mundo está na medida certa? Ainda tem espaço e recursos naturais para mais pessoas? E o Brasil?
Germana - O problema não está na quantidade de recursos, mas na utilização e distribuição deles. Nossa preocupação deveria focar em: o que fazemos com os recursos, quem está ‘fazendo’ e, como está fazendo. Ou seja, é a forma como se usa cada recurso o ponto central de qualquer preocupação e não a quantidade desses recursos. Essa pergunta é feita desde o século XIX, quando Thomas Malthus (economista britânico considerado o pai da demografia devido a sua teoria para o controle do aumento populacional) tenta responder: é possível dizer que há espaço sim. Você já andou por aí e viu terras ociosas ou improdutivas? Eu também. Aqui no Brasil então o número dessas terras é gigantesco. Repito: o problema é bem maior e não tão pontual quanto o fato de ter ou não ter recursos para as pessoas. O problema é que nem todos podem pagar por esses recursos, por exemplo, o recurso natural água.

ABJnotícias - Quais os problemas enfrentados por esse aumento populacional?
Germana - Posso estar sendo repetitiva, mas é ingenuidade acreditar que o problema é tão simples assim. O problema não é o número de pessoas, mas o sistema político e econômico vigente (o capitalismo financeiro) que impossibilita um número significativo de pessoas terem acesso a recursos naturais em detrimento de uma lucratividade desenfreada. Apenas um grupo menor de pessoas tem acesso a esses recursos e ainda “podem” desperdiçar.

ABJnotícias - As futuras gerações serão prejudicadas pelos problemas atualmente causados? Se sim, quais as previsões.
Germana - Nós estamos vivendo as consequências da modernidade, como afirma Antony Giddens (um sociólogo contemporâneo). Para deixar mais claro: na modernidade (século 19) surgem os agrotóxicos que poluem os rios e lençóis freáticos. Na atualidade, nós bebemos a água contaminada. Portanto, estamos vivendo a previsão ruim, seguindo suas palavras. Ou seja, já somos a geração que está sendo prejudicada, e o que dirá das seguintes.

ABJnotícias - Possíveis medidas para conter o desequilíbrio demográfico.
Germana - Não vejo problema no suposto “desequilíbrio” demográfico, mas vejo problema no desequilíbrio ambiental pelo desequilíbrio do capitalismo, pelo desequilíbrio social. Vejo problema no desequilíbrio econômico e, por conseguinte, no comportamento humano.

ABJnotícias - Há possibilidade de com esse aumento populacional, a taxa de mortalidade possa aumentar devido à falta de recursos?
Germana - Há falta de água potável em muitos países periféricos (como em Angola) e centrais (como nos E.U.A.), dentre os quais há pessoas que podem comprar e outras que não podem e bebem água de esgoto para não morrer de sede, mas de doenças infecciosas. Essa situação não teve início há dois anos, ou seja, isso não é notícia nova. Não é por causa da população mundial que aumentou. Quero dizer, com isso, que independente de a taxa de natalidade aumentar, de o crescimento demográfico se mostrar alto, tem pessoas morrendo por falta de acesso aos recursos naturais, como alimento e água potável (dentre outras coisas).
Gostaria de finalizar lembrando um fato curioso e contrário a falta de recursos naturais: o alto índice de obesos no Brasil tem se destacado, e também o de pessoas com doenças degenerativas. Primeiro pelo acesso a uma alimentação desequilibrada e segundo pelas diversas poluições que convivemos em nosso cotidiano (poluição do ar, da água, do solo, dos alimentos...).
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Sobre a ABJ

A ABJ é a agência júnior de jornalismo do curso de Comunicação Social do Unasp - Centro Universitário Adventista de São Paulo.

1 comentários

  1. ajudou bastante no trabalho :D

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