A vida por trás do cocar

A Expo Saúde foi realizada na aldeia Djaiko-aty.
Foto: Jéssica Guidolin
Por Jéssica Guidolin

No último dia 16, quarta-feira, foi realizado a Expo Saúde na tribo Tupi-Guarani, na aldeia Djaiko-aty, localizada na área rural da cidade de Miracatu (SP).

O evento teve a colaboração de alunos de diversos cursos do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp), campus Engenheiro Coelho, além de nutricionistas, fisioterapeutas, técnicos em enfermagem e uma odontóloga. “É a primeira vez que essa ação social é realizada em uma comunidade indígena”, afirma a geógrafa e professora do Unasp Germana Ramirez.

Além do envolvimento no projeto, alguns alunos que fazem parte de um grupo de pesquisa foram averiguar a questão da sustentabilidade do indígena e também a questão do gênero, já que nessa aldeia o cacique é uma mulher.

O Unasp realiza durante o ano diversos trabalhos voluntários, envolvendo alunos e a comunidade próxima ao campus. “O trabalho voluntário, em primeiro lugar, é um benefício para quem ajuda. Alguns acham que a obra é muito grande, mas se cada um fizer um pouco podemos fazer a diferença nesse mundo”, argumenta a odontóloga Fernanda Teixeira, que ajudou na ação social.

Conhecendo um pouco mais sobre a aldeia

Os alunos voluntários foram recepcionados com duas músicas e danças típicas. Todas as crianças e adultos estavam caracterizados de acordo com a sua cultura. Alguns tinham um pequeno cocar e outros usavam colares e acessórios feitos de seu próprio artesanato.


Todos os indígenas estavam caracterizados com
pinturas típicas. Foto: Jéssica Guidolin
Com pinturas típicas no rosto e cabelos grisalhos, Aparecida da Silva, mais conhecida como Nambí, é a cacique da aldeia há sete anos. Apesar de ser um cargo costumeiramente ocupado por um homem, Nambí não se intimida: “Acho que me escolheram para ser cacique por eu ser a mais velha daqui, e também por verem o trabalho que faço”. Com 66 anos, tem seis filhos e 24 netos.

Para realizar bem as tarefas do seu cargo, sempre que possível acompanha e participa junto com todos das atividades e serviços realizados pela aldeia. Além disso, aconselha os mais novos e coloca normas a serem seguidas. “Sempre converso, principalmente com aqueles que estudam na escola dos brancos, a não se envolverem emocionalmente com pessoas que são de outra cultura. Porque já temos uma mistura, não seria bom misturar ainda mais”, revela. Apesar disso, ela conta que já se acostumou com o estilo do homem branco. Para Nambí, é algo comum do dia a dia andar de ônibus, ir até a cidade caso precise de algo e se locomover até o pronto-socorro se alguém ficar doente.

A tecnologia já está presente por toda a aldeia. São TV’s, celulares, rádios, etc. Porém, dentro de sua cultura, a cacique sente muita falta de um pajé, que um líder religioso e curandeiro conhecido de toda tribo. “Antigamente existia um aqui, hoje já não temos mais. Isso faz falta”, lamenta.

A chegada à cidade

Antes de chegar a Miracatu, a aldeia se localizava em Peruíbe, litoral sul de São Paulo. O motivo da mudança foi a curiosidade. Nambí relata que sua mãe sempre comentava que na região de Miracatu havia muitos indígenas. E para completar, sua filha que estudava em São Paulo passava sempre pela BR e observava que havia terras devolutas. Então, em 2004, devido a essas situações favoráveis, se deslocaram para Miracatu, onde atualmente estão. Na época, vieram apenas cinco pessoas. Hoje já existem 12 famílias. Desde então, lutam para haver a demarcação da terra, considerada a maior dificuldade da aldeia, além da necessidade de melhoria na saúde.

Escola indígena

Para manter a cultura e obter uma melhor expectativa de vida, a comunidade indígena abriga uma escola modular. Com ensino de primeira à oitava série, a Secretária de Educação do município apoia e fornece todo material escolar. A cidade abriga oito aldeias, somando cerca de 450 indígenas, sendo 150 deles alunos e 23 professores, distribuídos em todas essas escolas.

A equipe de ensino da aldeia Djaiko-aty é composta por seis professores. Sara Rosário, diretora da escola, é a primeira em sua aldeia a ser formada pela Universidade de São Paulo (USP). Devido à universidade se localizar em São Paulo, os professores de cada aldeia se deslocavam durante 15 dias para a USP, onde tinham a teoria, e depois voltavam por 15 dias na aldeia para colocar em prática o que aprendeu. Durante todos os meses era esse o processo. Foram quatro anos de Magistério e dois de ensino superior. Mas não para por aí, ela tem planos de futuramente estudar mais. “Sempre há uma metodologia de ensino diferente para aprender”, conta.

A escola realiza atividades dinâmicas para melhorar o aprendizado. Um deles é o Projeto Contos e Re-contos. Consiste em um professor contar um mito ou uma lenda referente ao povo tupi-guarani, e depois os alunos reescreverem aquilo que ouvira. Através dessa atividade é possível avaliar a questão da gramática, produção de texto e as duas línguas que são ensinadas ao mesmo tempo, o português e o tupi-guarani.

Devido à implantação da escola, as crianças já não acompanham os pais no trabalho do plantio como era antes, por haver regras e horários. Para que isso não se perca por completo, na grade escolar há um horário dedicado ao projeto PLANTE. É o momento em que todos vão juntos à plantação e preparam a terra, plantam e colhem.

Ao concluir o ensino fundamental, os indígenas são direcionados para o Ensino Médio na cidade, na “escola de brancos”, como eles se referem.

Sustento

O artesanato, típico do povo indígena, gera um pouco de dinheiro que é acrescentado à renda da comunidade. Porém, boa parte do seu sustento é adquirida pelo salário dos professores, que acaba mantendo a comunidade. Apesar de o dinheiro ser conquistado por algumas pessoas, é natural da cultura o senso de coletividade e solidariedade. Todo mundo ajuda todo mundo. Além de ajudas extras, como da merenda escolar fornecida pela Secretaria da Educação, que é mandada em maior quantidade para os indígenas, a fim de alimentar a todos, já que eles têm o costume de realizar as tarefas em coletividade, inclusive as refeições.

Os indígenas tentam ao máximo conservar as raízes apesar de estarem inseridos na cultura do “povo branco”. “Nós brancos temos que aprender muito com eles, pois são calmos, solidários, pacíficos, centrados, reflexivos, observadores, ouvintes, muito inteligentes”, afirma a supervisora de ensino Lourdes Maria, que trabalha com indígenas a mais de 10 anos. É importante conservar a cultura, porém, é preciso saber aproveitar as facilidades que o “branco” tem para oferecer para melhorar a condição
Tags: , ,

Sobre a ABJ

A ABJ é a agência júnior de jornalismo do curso de Comunicação Social do Unasp - Centro Universitário Adventista de São Paulo.

0 comentários

Comente Esta Notícia